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Crônicas Oficiais: Diligência assombrosa

No início dos anos 2000, fui fazer a comunicação de uma cobrança judicial de tributos em Olaria, Zona Norte do Rio, cujo destinatário era um rapaz bem jovem. O pai atendeu na porta de uma bela casa de dois pavimentos, área nobre do bairro. Ao ser informado sobre a notificação, informou que o filho estava lá em cima, apontando para a sacada do andar superior. Antes que eu me preparasse para aguardá-lo, o pai esclareceu o mal-entendido: na verdade ele não estava se referindo ao segundo pavimento da casa, mas ao “outro andar” metafórico. O filho estava morto.

Aquilo me assombrou um pouco. Em todo caso, solicitei a certidão de óbito. Ele disse que não tinha. Desconfiei. Como era possível um pai não ter a certidão de óbito do próprio filho? Insisti se não havia nenhum documento. “Eu tenho o documento do IML que identificou o corpo dele”, reagiu. Tratava-se do laudo do necropapiloscopista, o profissional que identifica os corpos a partir das impressões digitais. O filho havia sido assassinado e enterrado como indigente e a família só descobriu o que aconteceu cinco anos depois. Enquanto isso, o seu CPF estava sendo usado em fraudes contra o Fisco…

Essa diligência, quase inacreditável, abriu pela primeira vez para mim uma janela para um Brasil mais profundo. O trabalho do Oficial de Justiça pode ser muito enriquecedor se ele conseguir integrar o que se passa nos autos, altamente burocratizado, e o mundo lá fora.”

Curtiu a crônica do OJ Federal do Rio de Janeiro Leonardo Rebellato? Mande também a sua que a gente publica na série “Crônicas Oficiais”. #ASSOJAFRJ